quarta-feira, outubro 10, 2007

Uma Figura Portuguesa, Com Certeza.

Restaurante Faz Figura

Ora eis um local que não poderia estar mais em sintonia com a agenda actual do discurso político português assente em temas como o plano tecnológico ou o já famoso Simplex. Aqui não há quadros electrónicos nem pc portáteis, mas há novos conhecimentos aplicados a sabores de sempre. No Faz Figura pratica-se uma cozinha de base bem portuguesa, procurando-se dar uma nova roupagem e interpretação à mesma, não deixando de parte uma ou outra proposta de fusão mais europeísta. Por aqui existe saber e criatividade mas sem cair em exageros. Entremos então e sentemo-nos à mesa neste local com vista para o Tejo, debruçado sobre Santa Apolónia.
Já com a ementa nas mãos ficamos a saber que na nova carta de estação aposta-se na utilização de produtos certificados. Ao percorrer as entradas os olhos fixam um Rosti de Alheira de Mirandela com maçã e moscatel (7€). Vai ter que ficar para a próxima porque não há (grrrr!). Não desisto e viro-me para a sopa de tomate com mousse de coentros e fio de ovos (6€), embora com receio que esta pudesse evidenciar algum excesso de acidez, dado já não estarmos no período auge do tomate. Receio infundado: o ph perfeito, o caldo cremoso, a boa ligação da mousse de coentros (que na verdade era mais uma emulsão) e a presença original do ovo em fios deixam-me rendido. Ainda neste departamento provo um correcto carpaccio de atum (7€) e uma excelente terrina de porco preto com avelãs e damascos (7€). Eu que julgava que uma terrina não tinha a menor graça, por geralmente ser feita com sucedâneos ou produtos manhosos, sou aqui presenteado a preceito: elementos bem ligados, sabor do porco preto a evidenciar-se e tudo bem aliado com uma emulsão adocicada. Nos pratos principais a escolha recai no folhado de cabrito do Barroso em cama de espinafre (18€), com a massa folhada bem trabalhada, sem excessos de gordura, e um interior recheado de pequenos pedaços de cabrito provenientes de um saboroso assado (um pouco mais de quantidade, não fazia mal nenhum…). Dos meus confrades de refeição, pesco um magnífico polvo com crosta de milho e vegetais salteados (19€) e ainda um notável risotto de bacalhau com nabiças, tomate seco e porco preto confitado (17€). Este prato de origem e confeccionado à italiana (ponto de cozedura, “al dente”) é feito com o tradicional arroz arbóreo da mesma proveniência, mas com todos os outros elementos ligados com queijo da ilha, em vez do habitual parmesão. Já nas sobremesas destaca-se o pão-de-ló tépido de chocolate (6€). Faz-me lembrar o de ovos de Alfeizeirão com o interior em torrente mas… de chocolate. Original é a outra sobremesa escolhida: gratinado de maçã bravo de esmolfe com queijo de cabra, puré de maçã e moscatel. O tipo de maçã utilizado não é tanga, faz toda a diferença e o sabor desta bravo de esmolfe genuinamente nacional está todo lá – pena que, quando em confronto, o queijo de cabra lhe oculte o sabor.
O vinho que nos acompanha é um branco do Douro, o Gouvyas 04, cujo a estrutura e envolvencia permite acompanhar adequadamente toda a refeição (sobremesas incluídas!).
No meio disto tudo onde é que entra o Simplex que refiro na introdução?
Digamos que um serviço eficiente e cordial (especialmente por parte do chefe de sala), tempos de espera adequados, a possibilidade de alguém arrumar o carro por nós e um site com informação completa e actualizada, facilita e simplifica muito. Saio satisfeito com uma frase de Moliére na cabeça: "Bem comido, a minha alma de nada quer saber" (frase impressa na ementa onde se apresenta o clube Faz Figura).
(Preço médio, com entrada, prato e sobremesa, 40/45€/pax com vinho).

Contactos: Rua do Paraíso 158 - Lisboa ; Telefone: 218868981 (www.fazfigura.com)

publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 10 de Outubro de 2007

2 comentários:

Anónimo disse...

Um restaurante, para mim, é mais do que comer bem. Gosto acima de tudo de sentir-me bem. Quando resolvi lá ir neste Verão e deparei-me com uma mesa cheia de formigas a coisa não começou lá muito bem. E quando o empregado manifestou a sua estranheza por eu estar incomodado com tanta formiga que parecia fazer questão de desfrutar da mesma vista para o rio que eu tinha, a minha opinião relativamente a esse restaurante ficou traçada!...

Miguel Pires disse...

na sala ou na esplanada?
Bom, pelo menos sempre eram formigas e não outros objectos rastejantes menos simpáticos. De qualquer forma não tive essa infelicidade nas duas vezes em que lá fui recentemente (ao contrário do que me aconteceu, em casa, onde neste Verão tive um exercito delas como hóspedes)