quinta-feira, janeiro 25, 2007

Passa por mim na Avenida

Restaurante Ad Lib

Há 15 dias atrás referi aqui que me intrigava a má fama dos restaurantes das grandes cadeias de hotéis quando noutras partes do mundo (nomeadamente no sudoeste asiático) muitos dos melhores restaurantes se encontram no seu seio. Neste sentido resolvi iniciar por cá, aleatoriamente, uma visita a alguns destes locais. Depois da impressão positiva com que fiquei do L’Appart (Meridien Park Atlantic Lisboa), desta vez resolvi experimentar o Ad Lib, do Sofitel Lisboa. Ao contrário do que o nome e o arco da entrada possam dar a entender, estamos num restaurante de cozinha mediterrânica contemporânea e não propriamente num restaurante árabe. Na verdade, o termo até deriva do latim e a cozinha praticada apresenta influências de locais bem mais distantes do que a zona do mediterrâneo.
Não se vê muita gente neste Ad Lib, o que é pena, uma vez que se trata de um local muito agradável – sofisticado mas sem intimidar – , convenientemente isolado do hotel e, o mais importante, onde se pratica uma cozinha que, não sendo de excelência, é de boa qualidade. No jantar em que estivemos presentes experimentámos, de entrada, uma sugestão da semana, o tártaro de abacate com sapateira (9€) e, da carta de estação, o lombo de atum marinado com leite coco e limas (11.50€). Ambas estavam muito agradáveis, notando-se a utilização de produtos de primeira e funcionando bem em termos de combinações (o puré de abacate, picante e temperado com cominhos, a envolver-se de forma proveitosa com o sabor marítimo da sapateira, assim como o leite de coco a transmitir um sabor exótico e menos usual ao atum fresco). A qualidade dos ingredientes, o apuro técnico e as combinações bem conseguidas ficariam mais uma vez patenteados nos pratos seguintes: ravioli (grande) recheado com lagosta e legumes cozidos, com um delicioso medalhão de lagosta salteado (25€) e no lombo e costeleta de borrego grelhados, acompanhado de um original puré de beringela e pasta de sésamo (18€). Para segundas núpcias ficou a curiosidade pelo salteado de peitos de codorniz marinados com soja e estufado de alho francês e gengibre (19€). No entanto, ainda houve oportunidade de incluir no segundo compartimento parte de um fondant de chocolate (6 €) – demasiado consistente - e, para saborear, o parfait de figos secos servido com shot de aguardente de medronho como acompanhamento (8€). Convenhamos que esta última solução líquida, após um branco da Quinta dos Roques (2005, 23€) e um Lello tinto (única opção a copo, 4€), produziram alguns estragos. Felizmente que há muito tempo que nestas digressões enogastronómicas o senhor bom senso incluiu no meu consciente o meio de transporte táxi.
Por último, de referir que o serviço foi atencioso e profissional, sem cair no péssimo hábito que por vezes acontece em locais meio vazios: o excesso de atenção que nos é dedicado, ou o oposto, a conversa animada entre colegas que nos remete ao abandono.
Deixo aqui então a sugestão: na próxima vez que ligarem a pedir dicas sobre restaurantes, tenha o Ad Lib na sua short list. Trata-se de um local requintado e sossegado tanto para um jantar a dois como para um almoço de negócios.

(Preço médio de refeição completa, com vinho: 40€ a 50€/pessoa. Ao almoço existe um menu próprio, com entrada, prato e sobremesa por 25€, ou 19€, se prescindir da entrada ou da sobremesa).

Contactos: Hotel Sofitel Lisboa ; Avenida da Liberdade, 127 ; Tel.: 213 228 300

publicado originalmente no jornal OJE (www.oje.pt) em 25 de Janeiro de 2007

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Saia um Cartão de Passageiro Frequente, sff!

A 2ª Pérola (ok, esta é só uma semi-pérola):

“Para Carmona Rodrigues esta iniciativa lançada pela câmara que dirige foi importante para assinalar a qualidade da gastronomia portuguesa, que continua a ser das melhores praticadas em todo o mundo”.

Portanto, ficámos a saber que o presidente da câmara de Lisboa é um grande conhecedor de toda gastronomia mundial. Provavelmente pôde confirmar esse conhecimento quando andou por todo o mundo a medir a copa dos pinheiros de Natal.

E o prémio "3 bananas" vai para...

No mesmo artigo do Público houve duas afirmações que me fizeram recordar a expressão, “when you don’t have anything to say, just don’t say it”.

A 1ª pérola…

Nunca participámos , há 25 anos. Em concursos a nível nacional nunca quisemos entrar, justifica o proprietário do Pap’Açorda, acrescentando que cada macaco no seu galho. As coisas locais para nós não são afirmativas diz José Miranda, referindo que a participação em concursozinhos não se coaduna com a maneira de estar do establecimento que gere”.

Se calhar podia ter sido chato, caso tivessem participado…

Os Garfos da Gastronomia Alfacinha

Gostei de ler no Público deste Domingo a matéria sobre o concurso gastronómico, “Lisboa À Prova”. Na véspera tinham sido revelados os restaurantes que receberam os “3 garfos”, a nota máxima atribuída pelo concurso. Confesso que fiquei agradavelmente surpreendido com a participação de quase todos os principais restaurantes da capital, bem como com a lista de premiados (com uma ou outra excepção concordo com a escolha feita). Achei também interessante o comentário de David Lopes Ramos em que este lança o desafio à organização de voltar a incluir como obrigatoriedade na ementa dos restaurantes a concurso, “pratos emblemáticos da cozinha alfacinha” . Na opinião do critico gastronómico do Público, a sugestão “obrigaria ao estudo e experimentação do que de mais representativo tem a nossa cozinha tradicional (…)” . Na verdade, alguns dos restaurantes premiados baseiam, parte, ou até mesmo a totalidade das suas ementas na reinterpretação da cozinha nacional e na valorização de produtos genuinamente portugueses. No entanto, a cozinha lisboeta raramente está representada.

Ver mais informações sobre o concurso e os premiados, aqui

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Cozinha Personalizada em Restaurante de Hotel

L’Appart

Sempre me intrigou o porque da má fama dos restaurantes de hotel ou, mais concretamente, dos restaurantes das grandes cadeias. A prática de uma cozinha internacional descaracterizada, a falta de ambiente dos espaços de restauração e a percepção de outsider para quem não está hospedado no local são algumas das características que podemos apontar para não os incluirmos na nossa short list de “restaurantes a considerar para jantarmos este fim-de-semana”. Dos grandes hotéis, nacionais e internacionais, contam-se pelos dedos os locais que ouvimos falar com frequência por motivos gastronómicos, pelo que há cerca de dois meses acedi ao convite do Meridien de Lisboa para conhecer a nova carta do Chefe Eddy Mello (bem como do Chefe de pastelaria, Luís Ascenção), sobre quem, regularmente, me habituei a ouvir boas referências. Nessa altura fiquei bem impressionado com as propostas apresentadas e fiquei com vontade de regressar mais tarde para fazer a critica ao local. Após um périplo pelo sudoeste asiático e depois de gratas experiências em restaurantes de grandes hotéis resolvi que era altura fazer algumas experiências por cá. Foi assim que naturalmente surgiu a ideia de começar pelo L’Appart.
Apesar de se poder aceder pelo interior, o restaurante tem entrada pelo exterior, o que é importante, porque permite marcar uma certa autonomia em relação ao reboliço de um hotel desta dimensão. A sala é ampla, mas pensada de forma a existirem espaços delimitados, permitindo um ambiente mais aconchegante. Não sei se existe algum estudo que refere o facto das pessoas não gostarem de jantar em locais vazios, mas o certo é que, pelo menos no dia em que lá estivemos, a tendência foi a de juntar as pessoas num dos espaços, o que não tem grande mal dado que existe uma boa distância entre mesas. Só foi pena que o espaço escolhido seja demasiado próximo do lobby do hotel, o que numa cidade cada vez mais conquistada pelo turismo de congressos, pode causar um ruído de fundo incómodo. Nota-se na carta de jantar (biológica) a preocupação de apresentar uma cozinha de autor com base em produtos portugueses e na cozinha nacional, não descurando influências e propostas de outras paragens. Como a temperatura própria da época não convida a entradas frias (até porque nos foi apresentado, como entretém de boca, um deslocado mini-cocktail de camarão com frutos tropicais), optámos por um creme de espargos verdes com aveludado de queijo cabra e tomate seco (12.50€) e um bacalhau composto em geleia quente e coulis de coentros (12.50€). Muito bom o primeiro, com um contraste assertivo entre o queijo de cabra e o creme de espargos, e bastante interessante o segundo, com o bacalhau composto apresentado como se fosse uma fatia de gelatina, com grão, cebola e ovo cozido - no fundo, uma reinterpretação original do tradicional bacalhau cozido com grão. Nos pratos principais, acabei por optar pelo confit de borrego merino em massa filo, espinafres e molho de menta (21€), apesar das implicações digestivas que tal escolha poderia vir a provocar, sobretudo quando a massa filo não é bem trabalhada. O receio que tinha desfez-se com a primeira garfada, uma vez que o borrego desfiado envolto na referida massa se apresentou surpreendentemente leve e sem sinal de gordura, com a técnica de cozedura lenta utilizada a puxar pelo sabor característico, mas não demasiado intenso, do delicioso borrego merino (raça típica do nordeste alentejano). Houve ainda a oportunidade de experimentar um bem conseguido peito de frango recheado com mousseline de lavagante, funcho caramelizado e molho de trufa branca (19.50€). De sobremesa foi-nos sugerido o buffet (8€), embora posteriormente viesse a saber que existia também possibilidade de escolha à carta. De qualquer forma, o que provei estava muito bem feito, como foi o caso da mousse enformada de morango e chocolate, o creme brulée, o bolo de chocolate ou as farófias. No que diz respeito aos vinhos, a carta é curta mas com várias opções, desde as marcas mais clássicas às mais emergentes e a preços que não sendo de joalharia são de hotel de 5 estrelas – ainda assim, pudemos acompanhar a refeição com um Altas Quintas, tinto, 2004, por 30€, o que não deixou de ser interessante. Quanto ao serviço, foi eficiente, simpático, embora com uma ou outra justificação despropositada. No fim, e com a conta, foi-nos apresentado um cartão com a sugestão do menu de degustação, que implica uma reserva com 24h de antecedência. Conjugar um restaurante de cozinha de autor com a rendibilidade de um hotel de uma grande cadeia tem destas coisas. Seja como for as propostas do chefe Eddy Mello merecem uma visita. Já agora, peça uma mesa na parte de cima, no lado mais distante do lobby do hotel. (Preço médio de refeição completa, à carta, com vinho: 50€/60€, pessoa).

Contactos: Hotel Meridien Park Atlantic , Rua Castilho 149, Lisboa . Tel. 213 818 700

publicado originalmente no jornal OJE (www.oje.pt) em 11 de Janeiro de 2007