sexta-feira, janeiro 30, 2009

Faleceu o Sr. Aya

O Aya foi um dos primeiros restaurantes onde iniciei o vício pela cozinha japonesa - Primeiro na Lapa, mais tarde nas Twin Towers, perto de Sete Rios. Ainda hoje considero-o o melhor entre pares, não só pela qualidade da matéria prima mas também pela arte da confecção e apresentação. Ficar ao balcão e ter a oportunidade de assistir ao trabalho do mestre Takashi Yoshitake e da sua equipa, era um privilégio.  Infelizmente um privilégio não mais possível de se repetir. A equipa continua, mas aquela figura que nos recebia sempre de sorriso aberto, não está mais entre nós. Takashi Yoshitake faleceu hoje (5ªF), vitima de doença prolongada.  

quarta-feira, janeiro 21, 2009

O Algodão não engana

Restaurante Sinal Vermelho

O Bairro Alto foi dos primeiros sítios, em Lisboa, onde muitos como eu começaram a jantar fora por conta própria. Juntava-se um grupo de amigos e procurava-se um lugar animado onde se pudesse comer e, acima de tudo, beber bem e barato. O conceito “comer bem” consistia em forrar o estômago generosamente de forma a termos uma resistência extra para aguentar o estado líquido pela noite fora. O tempo foi-nos apurando o gosto e as certezas absolutas de quem, com vinte e poucos anos, discutia as qualidades da Super Bock vs Sagres ou do João Pires vs BSE (a melhor cerveja e o melhor vinho do mundo, claro...). Nessa fase mais “adulta” já começávamos a desdenhar lugares de alimento e bebida a metro. Ao Casanostra e ao Pap’Açorda esperávamos poder ir um dia, mas, por enquanto, com os primeiros ordenados (umas fortunas, comparados com as ultimas mesadas) já nos considerávamos uns privilegiados por podermos frequentar a Tasca do Manel ou ao Bota Alta. Já não me recordo quando é que o Sinal Vermelho passou a fazer parte deste roteiro, mas sei que foi um dos poucos de que fiquei cliente por aquelas bandas. Continua a ser um dos sítios onde mais gosto de ir comer pataniscas ou carapauzinhos fritos com arroz de feijão ou de tomate (é que embora a qualidade do arroz tenha piorado continua a dominar-se, por ali, a arte da fritura). Os linguadinhos fritos também são muito recomendáveis, tal como as iscas com elas, o polvo à lagareiro ou, quando há, a cabidela de galinha.
Ao contrário da maior parte dos seus pares de vizinhança, o Sinal Vermelho possui uma sala espaçosa qb, toalhas e guardanapos de pano e copos de vinho bastante aceitáveis. Desta última vez que lá voltei obriguei-me percorrer outros pratos da lista e a decidir-me, primeiro, pelo magusto com bacalhau assado e, depois, por um coelho frito em vinha-d’alhos com batata frita e amêijoas - não sem antes confortar o estômago com um bom queijinho de ovelha amanteigado com a ajuda de uma boa broa de mistura. O magusto, uma espécie de migas (feitas com couve portuguesa, batata, cebola e alho) estava muito bem conseguido – ao nível do que se encontra pelo Ribatejo, de onde é originário. O bacalhau pecou por excesso de grelha, o que foi pena, uma vez que a posta alta que foi servida, prometia. Divinal é o mínimo que posso dizer do coelho frito: tenro e bem apaladado, com a marinada de vinha-d’alhos a valorizar e não a esconder o sabor da carne. No final a gula ainda permitiu saborear um bom leite-creme – a merecer que a capa de açúcar, queimada no momento, fique mais fina – e dar uma generosa colherada em baba de camelo alheia – saborosa mas demasiado liquefacta.
Em termos de vinhos a refeição foi acompanhada pelo branco alentejano, Paulo Laureano Premium, 2007, que ligou bem com ambos os pratos (não temendo a vinha de alhos). O serviço foi atencioso e eficiente, mesmo com uma ou outra falha menor - típica da azáfama de uma noite de fim-de-semana. Como é fácil de perceber vou continuar a ter boas razões para continuar a vir aqui deliciar-me com alguns dos meus pratos favoritos de cariz mais tradicional. É que, tal como no anúncio, este é um daqueles lugares em que o algodão não engana.

(Preço médio por refeição: 25/30€, pax, com vinho).

Publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 21 de Janeiro 2009

Contactos: Rua das Gáveas 89 (Bairro Alto)– Lisboa, Telefone:213461252

Mouro Phython

"...no entanto utilizo o vinho como anestésico desinfectante, e indutor de tratamento de branqueamento. 
Os que bebem demasiados copos, também ajudam ás fracturas de dentes"


Miguel Louro, corpo e Alma da Quinta do Mouro (produtor de alguns dos meus vinhos de eleição) responde às perguntas dos foristas do site Nova Critica Vinho (para seguir aqui)

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Arola Prêt-à-Porter

Restaurante Arola – Penha Longa

É cada vez mais comum, lá fora, grandes chefes de renome abrirem espaços de restauração mais acessíveis e informais, mantendo-os em paralelo com o principal restaurante - aquele onde se criou nome, onde se experimenta, onde se passa o conceito e a filosofia das propostas gastronómicas. Hoje um grande cozinheiro é também uma marca e embora existam alguns casos mais altruístas, o objectivo destes negócios paralelos tem sobretudo a ver com a expansão e rentabilização dessa marca. Cria-se o conceito a partir de algumas linhas mestras do original, adapta-se o mesmo a cada sítio, cria-se uma equipa e um parceiro local e voilá, a receita está pronta!
Não sei se foi assim que o catalão, Sergi Arola (duas estrelas Michelin em Madrid) chegou ao Hotel da Penha Longa, em Sintra, mas não devo estar a errar por muito. A primeira surpresa com que nos deparamos tem a ver com o espaço. À partida não se espera encontrar num clássico “Hotel&Golf Resort”, um espaço de design moderno, urbano, muito ao estilo lounge - como numa zona nocturna de cidade. Num primeiro olhar o espaço parece pequeno, mas quando o campo de visão aumenta percebe-se que é amplo e está inteligentemente subdividido ao ponto de se tornar aconchegante mesmo quando está só meio lotado. Chegar ali num Sábado de chuva e nevoeiro, passar pela imensidão de toda a envolvente verdejante do hotel - sem ver vivalma -, ser recebido com simpatia (e sem sobranceria) e encontrar um local assim bem concebido é estar já a pontuar ainda antes do jogo começar.
E o jogo tem muito por onde escolher. A ementa condiz com a informalidade do lugar: temos as entradas “Clássicos do Arola” (uma espécie de tapas com mais ou menos sofisticação), e os “quase um prato”. O Menu Sergi Arola (39€) tem de uns e de outros e embora alguns dos 7 pratos sejam para partilhar, no final, sentimo-nos reconfortados. Logo de inicio, um statement catalão: pão ligeiramente tostado, um dente de alho e tomate pequeno. Faça você mesmo: corte o alho e o tomate ao meio, esfregue ambos no pão, deite uma pitada de flor de sal e um fio de azeite e entretenha a boca enquanto espera. Comida de pobre em lugar de rico - gostei da provocação (embora a coincidência com a prova do vinho, não seja a mais indicada). Depois começaram a chegar as propostas, umas a solo outras em dueto. Primeiro as entradas frias: um escabeche de cogumelos selvagens, muito bom; um carpaccio de vieiras bem conjugado com maracujá e ovas de arenque e um tartar de bacalhau com vinagrete de gengibre, este demasiado subtil. Nas entradas quentes: umas deliciosas batatas bravas com aioli e recheadas com um molho de tomate ligeiramente picante; uma espuma de couve-flor com ovo de codorniz e salpicão - que teria sido perfeita com um pouco menos do enchido. Nos quase pratos, gostei muito da fideuá (massa valenciana) à pescador: prato de tacho com matéria-prima bem tratada (tamboril, camarão e choco) envolvidos num fundo apurado mas sem mascarar os sabores. Tive ainda oportunidade de provar o prato de carne e fiquei feliz por ter optado antes pela fideuá já que as fatias de peito de pato estavam demasiado insípidas apesar do saboroso mirepoix de legumes onde pousavam (já do salpicon de foie e das molejas do enunciado, não lhes senti a presença). Por ultimo, e já fora do menu, provei ainda o ovo a baixa temperatura acompanhado com pão com chouriço. Mais uma vez constatei que quando os produtos são bons e bem tratados, mesmo os mais simples, podem ter um efeito no palato tão reconfortante como o de qualquer iguaria mais sofisticada. Já a sobremesa poderia ser um pouco mais interessante: o bolo húmido, o gelado de manga e a mousse de chocolate espessa, ainda que bons, não fizeram mais do que cumprir a função doce de final da refeição.
No que diz respeito aos vinhos, a carta, bem como o serviço e os copos, pareceram-me bem ajustados ao tipo de restaurante. Só é de lamentar a opção por uma prática de preços absurdos, numa altura que finalmente se começa a ver, na nossa restauração, alguma contenção a este nível (acompanhou o menu, o branco Casal Figueira Tradition 2005 – 27€).
Por ultimo, de referir que o serviço simpático e descontraído (mesmo com um ou outro ponto a necessitar de afinação) contribuiu para a percepção final desta boa colecção prêt-à-porter de um cozinheiro de alta cozinha.
(preço da refeição descrita, com água e café: 115€/2 pessoas)

Publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 7 de Janeiro 2009


Contactos: Hotel Penha Longa - Estrada da Lagoa Azul, Linhó, Sintra ; Telefone: 21 924 9011 (www.penhalonga.com/)