quinta-feira, dezembro 28, 2006

A A Gill

AA Gill é um daqueles críticos que tem tanto de genial como de irritante. Tomei conhecimento da sua existência, em Agosto do ano passado, a propósito de uma critica, no Sunday Times, ao Tugga, (restaurante londrino de cozinha lusa). Nesse artigo fazia referências muito pouco abonatórias sobre o nosso país e sobre a nossa gastronomia, o que provocou bastante indignação e deu origem a um interessante debate no fórum d’Os5as8 (ler aqui).

Entretanto tenho acompanhado, a espaços, as suas criticas no Timesonline e fico a imaginar o que seria se existisse uma personagem deste género em Portugal. Digo isto porque sempre que faço uma critica menos abonatória sobre um restaurante que visito, recebo uma dezena de emails e comentários a insultar-me (como a maior parte dos comentários são anónimos e não apresentam qualquer argumentação, obviamente que não os publico).

Leiam este exemplo ( aqui, a partir de "Anyway... " ) e vejam se comparado com algumas coisas que escrevi, não fazem de mim um menino do coro.

Nota: não, não pretendo ser nenhum AA Gill português - até porque me falta o talento - mas o nacional porreirismo e os brandos costumes são coisas que me irritam bem mais do que a arrogância e pedantismo desta personagem.

domingo, dezembro 24, 2006

À falta do peixe, a cana...



.... agora pesque quem tiver a arte!

P.S. obrigado à Teresa e ao Vitor por este cartão de Natal original..

quarta-feira, dezembro 20, 2006

"Luís Baena, o chefe que marcou 2006"

Gostei de ler o artigo do Duarte Calvão, no DN - Boa Vida. Assino e subscrevo! (ler aqui).

sexta-feira, dezembro 15, 2006

United Colors of…

Restaurante Luca

Imaginem um local cujo o dono é Italiano, o chefe Japonês, a maior parte dos empregados de sala brasileiros e onde se pratica uma cozinha de base italiana com influência oriental, francesa e portuguesa. A isto acrescentem um bar marroquino onde se servem tapas e parece que estou a falar da sede do Programa Erasmus, de um restaurante da ONU, ou de um anúncio da Benetton. Mas não, refiro-me ao Luca, “o fenómeno”. Utilizo este epíteto porque este local é um verdadeiro case study. Os seus dois turnos nocturnos (20h e 22h) enchem-se, praticamente todos os dias, de pessoas dos mais diversos quadrantes sociais que se reúnem para apreciar a qualidade da cozinha aqui praticada, a simpatia e a eficiência de quem os atende. Para sucesso não será de estranhar, também, a generosidade das doses (mesmo as entradas), bem como um leque variado de propostas, que fazem deste local um dos mais democráticos que conheço – tanto é possível sair satisfeito por 20€ como extasiado por 50€. Acresce ainda a vantagem de estarmos num local agradável e de apresentação cuidada. Muito longe, por isso, do ambiente barulhento de outro tipo de democracia - a cervejaria.
Por vezes, vou lá quando me apetece simplesmente o excelente gnocchi com lagostins e molho de tomate (18.50€) ou o já clássico ravioli de camarão tigre e lima (15.90€); outras vezes, para um jantar mais completo, como foi o caso desta ultima visita, em que aproveitei para experimentar algumas novidades da carta sazonal. De entrada, começámos (como habitualmente, éramos dois) por partilhar umas vieiras em creme de cenoura, gengibre e lemongrass (13.60€) e uns filetes de cavala assados (9.80€) que vinham sobre feijão filet salteado e ajoblanco (creme andaluz à base de amêndoas, alho, migas de pão e azeite). Uma delicia, que só pecou pela quantidade (3 filetes é um exagero!). As vieiras, não atingiram o sétimo céu – como acontece com as suas companheiras de lista, em tatin com tapenade de azeitona preta (12.60€) - mas passaram com honra e distinção. A ligação de sabores funciona muito bem, mas falta-lhes maior contraste de texturas (apesar do estaladiço das amêndoas torradas). De seguida voltámos a um clássico, os tais gnocchi que referi. Acho que já comi este prato aqui para cima de meia dúzia de vezes e devo dizer que foi sempre excelente. Mais do que com outro qualquer ingrediente, quando estas pequenas bolas achatadas, feitas de trigo e batata, são más, podem ser mesmo muito ruins – é por isso que raramente as peço noutros lugares. Agora no Luca, é um prato obrigatório!
Para a etapa seguinte, em que teria dado jeito um estômago suplente, regressámos às novidades de época com uma peça de caça, mais propriamente um pombo no forno. Foi aconselhado que o mesmo fosse comido com as mãos (tendo sido fornecido um babete, de forma a prevenir qualquer imprevisto). Não foi necessário dado que já vinha dividido pelos dois e o tempo de assadura perfeito, permitiu a fácil utilização dos talheres (esta ave costuma ter uma carne rija quando demasiado mal passada, ou seca quando acontece o oposto – pelo que é fundamental acertar com o ponto, como foi o caso). O acompanhamento de aipo salteado, castanhas e arroz selvagem, trouxe uma profusão de sabores que harmoniosamente contrastaram com a intensidade do pombo e do consommé de carne que o acompanhava. Crente da teoria dos dois compartimentos (um para salgados e outro para doces), ainda consegui pedir uma sobremesa. Na verdade duas: o original Tiramisu Marroquino - gelado de líchias, creme de mascarpone, gelatina de chá, telha de Amêndoa e laranja marinada (no comments!) – e, para acabar em beleza, um bastardinho de Azeitão 30 anos (9.80€/copo), uma preciosidade única e que merecia um copo mais adequado, bem como ter sido servido a uma temperatura mais baixa. Aliás, estes são os únicos aspectos que gostaria de ver melhorado no Luca: melhores copos para vinhos (ou pelo menos, para alguns vinhos) e estes servidos à temperatura correcta. De resto, neste aspecto, a carta de vinhos, não sendo longa, possibilita várias e boas opções e os preços praticados são bastante razoáveis. Neste jantar, bebemos um Tiara Branco, 2005 (23.50€), com as entradas e os gnocchi, e um Ventozelo tinto, a copo, a acompanhar o pombo.
Ainda não é desta que os adeptos do “bota abaixo”- essa espécie mesquinha e pequenina que adora dizer mal e de tudo aquilo que se mantém sucessivamente em alta - vão poder ler algo de mau sobre este local. Já agora, também não faria mal nenhum que os Srs. do famoso guia Michelin estivessem atentos a este lugar. Não é nada que tire o sono à dupla Luca Manissero& Massahiro Kawai. Mas lá que merecem, merecem!

Rua Stª Marta 35, Lisboa ; Telefone: 21 315 02 12

publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 14 de Dezembro de 2006

sábado, dezembro 02, 2006

Slow food na Aldeia da Serra

Restaurante O Chana

Quem me conhece sabe que não sou grande adepto do volante. Por isso levam-me a sério quando digo que existe um pequeno restaurante na Aldeia da Serra D’Ossa, já a chegar ao Redondo, que me faz fazer percorrer 200km só para lá ir almoçar e regressar no mesmo dia (sim, sou daqueles para quem qualquer deslocação de mais de uma hora obriga a estadia). Hoje O Chana já não é mais um segredo que foi passando de boca em boca, do mesmo modo que já não é a tasca acolhedora de um passado recente. Foi-se tornando cada vez mais conhecido e teve necessidade de mudar de ares, mas não para muito longe porque, por aqui, respira-se devagar. Quando me falaram desta mudança, para uns metros acima, temi o pior, temi que se tivesse transformado num salão para casamentos e baptizados. Felizmente nada disso aconteceu e o Chana encontra-se hoje num local maior, mais condigno e com melhores condições para quem, na cozinha, se dedica a preparar as iguarias que nos fazem chorar e pedir por mais. E que iguarias são estas? Na verdade, são coisas simples, de cozinha regional, muito bem preparadas e de paladar singular. A introdução à ementa é-nos feita pelo Sr. Bernardino, o patriarca da casa, que no final da sua mini-palestra a deixa connosco para reflexão. Eu diria que é obrigatório começar pela trilogia de pimentos assados, com alho (2.5€), fígado de coentrada (3.5€) e farinheira assada (3€). Dizem-me que são entradas comuns noutras casas alentejanas. É verdade, mas nunca me sabem tão bem como aqui. A qualidade dos produtos é inquestionável, no entanto, existe um segredo qualquer que nunca consegui descobrir – apenas sinto que o fígado de coentrada perdeu algum carácter divino e é agora “apenas” muito bom (pode ser só impressão, mas tenho a sensação de que essa característica foi à vida ao deixarem de utilizar o exíguo e vulgar fogareiro a carvão). Como prato principal, sempre que há, não perco a sopa de tomate (8.5€). Mesmo nesta altura, que já não é época daquele tomate único que existe na região (grande, firme e disforme), esta sopa é muito bem conseguida: untuosa, sem acidez e enriquecida com lombo e entrecosto de porco, chouriço, farinheira, ovo escalfado e um surpreendente pedaço de bacalhau, tudo funcionando em plena sintonia. Desta última vez voltei também às migas com entrecosto (8.5€), prato pesado mas muito saboroso e, por sugestão, às queixadas, ou burras de porco preto (8.5€). Já aqui referi que não era grande adepto desta parte do animal (trata-se da carne do queixo). No entanto, não quis deixar de experimentar este prato – muito em voga, tanto na cozinha tradicional como na de autor. Devo dizer que a experiência foi muito boa, a carne era tenra e saborosa mas sem a desagradável textura, algo gelatinosa, que habitualmente apresenta. Acompanhei-a muito bem com as migas do prato anterior, já que foi dispensada a redundância de batata frita e batata assada do acompanhamento. Lamentei não estarmos no Verão para poder comer o fabuloso gaspacho com carapaus fritos, presunto e chouriço. Também me falaram que o ensopado de borrego (8.5€) é muito bom, mas já não havia lugar, tal como para o leitão, uma surpresa que deixaria muitos senhores da Bairrada surpreendidos. Antes do passo seguinte, gosto sempre de adaptar o paladar com uma laranja descascada. Vão dizer que devo estar a delirar, mas na verdade, estas laranjas são únicas (de doçura e acidez perfeitas – talvez, porque são “ali da serra”)! Adaptação feita, foi tempo de confirmar a qualidade da sericaia (fofa e humedecida q.b.), servida com uma ameixa d’Elvas, passando assim ao lado da polémica de que este acompanhamento é uma modernice que não faz parte deste doce regional (na verdade, os puristas podem sempre colocá-la de lado). Posto isto tudo até consigo perdoar o facto de o Sr. Bernardino se esticar um bocadinho no preço dos vinhos (tendo em conta o tipo de casa, o serviço de vinhos que presta e a região onde se encontra) e por não apresentar mais opções de gama média.
Resta-me referir o serviço simpático e familiar, sem excessos nem pressas, mas eficiente. A alma da casa dá pelo nome de Bernardino, mas não queria deixar de prestar a minha homenagem a quem, no calor dos tachos, mais contribui para a minha felicidade por estes lados, a Sra. D. Teresa. Bem haja(m)!
(Preço médio, com vinho, 18/20€).

Aldeia da Serra D’Ossa, Redondo ; Telefone: 266 909 414

publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 01 de Dezembro de 2006