sexta-feira, dezembro 15, 2006

United Colors of…

Restaurante Luca

Imaginem um local cujo o dono é Italiano, o chefe Japonês, a maior parte dos empregados de sala brasileiros e onde se pratica uma cozinha de base italiana com influência oriental, francesa e portuguesa. A isto acrescentem um bar marroquino onde se servem tapas e parece que estou a falar da sede do Programa Erasmus, de um restaurante da ONU, ou de um anúncio da Benetton. Mas não, refiro-me ao Luca, “o fenómeno”. Utilizo este epíteto porque este local é um verdadeiro case study. Os seus dois turnos nocturnos (20h e 22h) enchem-se, praticamente todos os dias, de pessoas dos mais diversos quadrantes sociais que se reúnem para apreciar a qualidade da cozinha aqui praticada, a simpatia e a eficiência de quem os atende. Para sucesso não será de estranhar, também, a generosidade das doses (mesmo as entradas), bem como um leque variado de propostas, que fazem deste local um dos mais democráticos que conheço – tanto é possível sair satisfeito por 20€ como extasiado por 50€. Acresce ainda a vantagem de estarmos num local agradável e de apresentação cuidada. Muito longe, por isso, do ambiente barulhento de outro tipo de democracia - a cervejaria.
Por vezes, vou lá quando me apetece simplesmente o excelente gnocchi com lagostins e molho de tomate (18.50€) ou o já clássico ravioli de camarão tigre e lima (15.90€); outras vezes, para um jantar mais completo, como foi o caso desta ultima visita, em que aproveitei para experimentar algumas novidades da carta sazonal. De entrada, começámos (como habitualmente, éramos dois) por partilhar umas vieiras em creme de cenoura, gengibre e lemongrass (13.60€) e uns filetes de cavala assados (9.80€) que vinham sobre feijão filet salteado e ajoblanco (creme andaluz à base de amêndoas, alho, migas de pão e azeite). Uma delicia, que só pecou pela quantidade (3 filetes é um exagero!). As vieiras, não atingiram o sétimo céu – como acontece com as suas companheiras de lista, em tatin com tapenade de azeitona preta (12.60€) - mas passaram com honra e distinção. A ligação de sabores funciona muito bem, mas falta-lhes maior contraste de texturas (apesar do estaladiço das amêndoas torradas). De seguida voltámos a um clássico, os tais gnocchi que referi. Acho que já comi este prato aqui para cima de meia dúzia de vezes e devo dizer que foi sempre excelente. Mais do que com outro qualquer ingrediente, quando estas pequenas bolas achatadas, feitas de trigo e batata, são más, podem ser mesmo muito ruins – é por isso que raramente as peço noutros lugares. Agora no Luca, é um prato obrigatório!
Para a etapa seguinte, em que teria dado jeito um estômago suplente, regressámos às novidades de época com uma peça de caça, mais propriamente um pombo no forno. Foi aconselhado que o mesmo fosse comido com as mãos (tendo sido fornecido um babete, de forma a prevenir qualquer imprevisto). Não foi necessário dado que já vinha dividido pelos dois e o tempo de assadura perfeito, permitiu a fácil utilização dos talheres (esta ave costuma ter uma carne rija quando demasiado mal passada, ou seca quando acontece o oposto – pelo que é fundamental acertar com o ponto, como foi o caso). O acompanhamento de aipo salteado, castanhas e arroz selvagem, trouxe uma profusão de sabores que harmoniosamente contrastaram com a intensidade do pombo e do consommé de carne que o acompanhava. Crente da teoria dos dois compartimentos (um para salgados e outro para doces), ainda consegui pedir uma sobremesa. Na verdade duas: o original Tiramisu Marroquino - gelado de líchias, creme de mascarpone, gelatina de chá, telha de Amêndoa e laranja marinada (no comments!) – e, para acabar em beleza, um bastardinho de Azeitão 30 anos (9.80€/copo), uma preciosidade única e que merecia um copo mais adequado, bem como ter sido servido a uma temperatura mais baixa. Aliás, estes são os únicos aspectos que gostaria de ver melhorado no Luca: melhores copos para vinhos (ou pelo menos, para alguns vinhos) e estes servidos à temperatura correcta. De resto, neste aspecto, a carta de vinhos, não sendo longa, possibilita várias e boas opções e os preços praticados são bastante razoáveis. Neste jantar, bebemos um Tiara Branco, 2005 (23.50€), com as entradas e os gnocchi, e um Ventozelo tinto, a copo, a acompanhar o pombo.
Ainda não é desta que os adeptos do “bota abaixo”- essa espécie mesquinha e pequenina que adora dizer mal e de tudo aquilo que se mantém sucessivamente em alta - vão poder ler algo de mau sobre este local. Já agora, também não faria mal nenhum que os Srs. do famoso guia Michelin estivessem atentos a este lugar. Não é nada que tire o sono à dupla Luca Manissero& Massahiro Kawai. Mas lá que merecem, merecem!

Rua Stª Marta 35, Lisboa ; Telefone: 21 315 02 12

publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 14 de Dezembro de 2006

5 comentários:

Anónimo disse...

Simplesmente excelente!

Anónimo disse...

Simplesmente excelente!

Anónimo disse...

Se este restaurante merece estar no guia michelin por causa da comida, eu também merecia estar num paraíso qualquer.
É um restaurante muito agradável de se estar,(tirando o bar marroquino, que nada têm a ver com o resto)muito bom atendimento, jantei por duas vezes,em nenhuma delas me agradou, uma delas foi um risoto com borrego, sabia a bedum que até enjoava maomé, outra foi penne com polvo, que de polvo não se via. e caro senhor eu não sou dos "bota abaixo" nem essa especie mesquinha e pequenina, mas tal como o senhor também tém o direito de fazer uma critica negativa com justa causa.
Alvaro Falcão

Miguel Pires disse...

...por isso lhe concedo esse direito, mesmo não partilhando da sua opinião.

Toni disse...

Eu comi quase os mesmos pratos e não coincido na apreciação.

http://www.os5as8.com/forum/viewtopic.php?t=4685&highlight=luca