sexta-feira, janeiro 12, 2007

Cozinha Personalizada em Restaurante de Hotel

L’Appart

Sempre me intrigou o porque da má fama dos restaurantes de hotel ou, mais concretamente, dos restaurantes das grandes cadeias. A prática de uma cozinha internacional descaracterizada, a falta de ambiente dos espaços de restauração e a percepção de outsider para quem não está hospedado no local são algumas das características que podemos apontar para não os incluirmos na nossa short list de “restaurantes a considerar para jantarmos este fim-de-semana”. Dos grandes hotéis, nacionais e internacionais, contam-se pelos dedos os locais que ouvimos falar com frequência por motivos gastronómicos, pelo que há cerca de dois meses acedi ao convite do Meridien de Lisboa para conhecer a nova carta do Chefe Eddy Mello (bem como do Chefe de pastelaria, Luís Ascenção), sobre quem, regularmente, me habituei a ouvir boas referências. Nessa altura fiquei bem impressionado com as propostas apresentadas e fiquei com vontade de regressar mais tarde para fazer a critica ao local. Após um périplo pelo sudoeste asiático e depois de gratas experiências em restaurantes de grandes hotéis resolvi que era altura fazer algumas experiências por cá. Foi assim que naturalmente surgiu a ideia de começar pelo L’Appart.
Apesar de se poder aceder pelo interior, o restaurante tem entrada pelo exterior, o que é importante, porque permite marcar uma certa autonomia em relação ao reboliço de um hotel desta dimensão. A sala é ampla, mas pensada de forma a existirem espaços delimitados, permitindo um ambiente mais aconchegante. Não sei se existe algum estudo que refere o facto das pessoas não gostarem de jantar em locais vazios, mas o certo é que, pelo menos no dia em que lá estivemos, a tendência foi a de juntar as pessoas num dos espaços, o que não tem grande mal dado que existe uma boa distância entre mesas. Só foi pena que o espaço escolhido seja demasiado próximo do lobby do hotel, o que numa cidade cada vez mais conquistada pelo turismo de congressos, pode causar um ruído de fundo incómodo. Nota-se na carta de jantar (biológica) a preocupação de apresentar uma cozinha de autor com base em produtos portugueses e na cozinha nacional, não descurando influências e propostas de outras paragens. Como a temperatura própria da época não convida a entradas frias (até porque nos foi apresentado, como entretém de boca, um deslocado mini-cocktail de camarão com frutos tropicais), optámos por um creme de espargos verdes com aveludado de queijo cabra e tomate seco (12.50€) e um bacalhau composto em geleia quente e coulis de coentros (12.50€). Muito bom o primeiro, com um contraste assertivo entre o queijo de cabra e o creme de espargos, e bastante interessante o segundo, com o bacalhau composto apresentado como se fosse uma fatia de gelatina, com grão, cebola e ovo cozido - no fundo, uma reinterpretação original do tradicional bacalhau cozido com grão. Nos pratos principais, acabei por optar pelo confit de borrego merino em massa filo, espinafres e molho de menta (21€), apesar das implicações digestivas que tal escolha poderia vir a provocar, sobretudo quando a massa filo não é bem trabalhada. O receio que tinha desfez-se com a primeira garfada, uma vez que o borrego desfiado envolto na referida massa se apresentou surpreendentemente leve e sem sinal de gordura, com a técnica de cozedura lenta utilizada a puxar pelo sabor característico, mas não demasiado intenso, do delicioso borrego merino (raça típica do nordeste alentejano). Houve ainda a oportunidade de experimentar um bem conseguido peito de frango recheado com mousseline de lavagante, funcho caramelizado e molho de trufa branca (19.50€). De sobremesa foi-nos sugerido o buffet (8€), embora posteriormente viesse a saber que existia também possibilidade de escolha à carta. De qualquer forma, o que provei estava muito bem feito, como foi o caso da mousse enformada de morango e chocolate, o creme brulée, o bolo de chocolate ou as farófias. No que diz respeito aos vinhos, a carta é curta mas com várias opções, desde as marcas mais clássicas às mais emergentes e a preços que não sendo de joalharia são de hotel de 5 estrelas – ainda assim, pudemos acompanhar a refeição com um Altas Quintas, tinto, 2004, por 30€, o que não deixou de ser interessante. Quanto ao serviço, foi eficiente, simpático, embora com uma ou outra justificação despropositada. No fim, e com a conta, foi-nos apresentado um cartão com a sugestão do menu de degustação, que implica uma reserva com 24h de antecedência. Conjugar um restaurante de cozinha de autor com a rendibilidade de um hotel de uma grande cadeia tem destas coisas. Seja como for as propostas do chefe Eddy Mello merecem uma visita. Já agora, peça uma mesa na parte de cima, no lado mais distante do lobby do hotel. (Preço médio de refeição completa, à carta, com vinho: 50€/60€, pessoa).

Contactos: Hotel Meridien Park Atlantic , Rua Castilho 149, Lisboa . Tel. 213 818 700

publicado originalmente no jornal OJE (www.oje.pt) em 11 de Janeiro de 2007

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