quinta-feira, julho 12, 2007

Aqui não há salada de delicias do mar

Restaurante Eira do Mel

Numa altura em que muitos portugueses já se encontram ou se preparam para rumar a sul, muitos pecadores da gula não querem deixar de lado a questão “onde comer?”. No Algarve, tal como noutros grandes destinos turísticos, convive-se lado a lado com o melhor e com o pior. Se de um lado temos a maior concentração de estrelas Michelin (quase todos na zona de Almancil) do outro temos a maior profusão de locais onde imperam as “originais” sandes de fiambre ou de queijo bola; as saladas de atum, frango ou delicias (dizem eles) do mar; os hambúrgueres descongelados à pressa; ou as sardinhas a despachar na nova expo de Portimão. Á custa de alguns assaltos à mão armada (no que diz respeito à relação preço/qualidade) ainda se consegue comer aqui ou ali, uma cataplana decente, bom peixe e bom marisco - a probabilidade é tanto maior quanto mais no aproximarmos de uma ou de outra ponta da região. Sem cair nestes extremos, continuam a existir, porém, alguns restaurantes em que vale a pena a deslocação. Locais que apostam em manter viva uma cultura gastronómica regional, desconhecida na maior parte do país, onde, para além das conhecidas cataplanas, prontificam pratos como carapaus alimados, estupeta de atum, canja de conquilhas, xerém com sardinhas, arroz de langueirão, entre outros. Os anos passam mas os nomes referenciado não mudam muito (quase sempre com o Vila Lisa, na Mexilhoeira Grande, à cabeça) . No ano passado, no entanto, surgiu nossa imprensa de referência, uma nova luz: o Eira do Mel, em Vila do Bispo. Consulta-se o site na Internet e pela descrição dos pratos e dos seus ingredientes, nota-se um cuidado na escolha e divulgação dos produtos da região.
A noite fria do Sábado em que fomos adequava-se às propostas de peso da carta com destaque para as cataplanas de polvo, de peixe, de coelho ou de galinha.
Ultrapassada a porta de entrada “cai-se” directamente na ampla sala de refeições, de decoração rústica como seria de esperar mas de iluminação algo tristonha. Sentamo-nos, escolhemos e, sem pressas, os pedidos vão chegando à mesa. Primeiro um… chamemos-lhe, couvert misto (7.75€) - no sentido em que metade foi pedido, a outra metade não-, composto por pão, manteiga, uma boa pasta de sardinha confeccionada na casa, cenouras avinagradas (óptimas) e dois ovos de codorniz (com casca, provavelmente para nos entretermos e evitar-se assim grandes tempos de espera entre os pedidos). De seguida, de entrada, uns filetes de biqueirão anchovados, com alcaparras e tomate cereja (4.50€). A boa qualidade e execução do primeiro; a sua ligação com umas alcaparras - igualmente de forte personalidade -, e o contraste adocicado, mas de boa acidez, do tomate cereja e de bom azeite, fizeram desta entrada uma iguaria de eleição. Com as papilas e o estômago preparado foi então a vez da Cataplana de polvo com batata-doce de Aljezur (30€, 2 pax). Os produtos com que foi confeccionada pareceram-me de boa qualidade e a ligação com a batata-doce, correcta - com esta suficientemente firme (e não demasiado doce) a absorver apenas ligeiramente os sucos de ligação. Apenas faltou alguma complexidade neste campo que transmitisse maior apuro à matéria-prima principal, o polvo.
Nas sobremesas, gostei bastante na torta de amêndoa e da originalidade de vir acompanhada de um excelente sorbet de laranja do Algarve (4.50€) – aliás, nota-se em quase todos os pratos o cuidado na apresentação e um toque de modernidade que não desvirtua em nada a base tradicional dos mesmos.
De destacar ainda a atenção dada aos vinhos e ao seu serviço, com copos e temperaturas adequados, pelo menos no branco que acompanhou a refeição, o aristocrático alentejano, Barão de B (20€).

(preço médio por uma refeição completa, com entrada, prato e sobremesa: 30/35€ por pessoa, com vinho).

Estrada do Castelejo, Vila do Bispo. Tel. 282 639 016 (www.eiradomel.com)

publicado originalmente no jornal OJE (http://www.oje.pt/) em 11 de Julho de 2007

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